Ao estudar uma porta, a chave feita para abri-la torna-se dispensável quando se tem um profundo conhecimento sobre a fechadura.
quarta-feira, 14 de maio de 2014
A artimanha.
Costumo amanhecer
já fadigado pelo vir do dia
jurava-me ser nuvem
ao ofegar a respiração
e na janela das conduções motorizadas
resplandece por trás dos prédios ainda em obra
tímido entre os guindastes
um sol de hoje:
diferente do de ontem
não mais o mesmo de amanhã
todas as preocupações
zipadas no fecho ecler
de uma mochila surrada
desembrulho mil coisas
que nem pareciam ali caber
o sono, doce convivência
me aborda no despertar
quando inicio uma caminhada
do quarto ao corredor
o dia quer entrar em casa
pelo basculante
janela, vitral
antes de descer as escadas
olho em perspectiva para trás
e a cozinha parece viva, em sua plenitude
enquanto o quarto lamenta
a falta de meu corpo sobre a cama
implacavelmente abandono meu lar
vivo, em sua própria existência
e me esperam as portas
os batentes
as grades, vidros
esperam incansavelmente
pelo meu regresso repentino
mas antes que a cama lance
sobre minha alma, um olhar de desdém
intercepta-me, ardilosa madrugada
com suas artimanhas:
farfalha a amendoeira
café, alguém
a cortina tampouco se importa
- já estou em casa -
a cadeira me é tão familiar
sempre foi
só que agora sou objeto: existo com força
não sou pra mim
mas me preservo
intercepta-me, ardilosa madrugada
minha ressaca é saudade
que ao despertar
sempre relevo.
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